13.4.05

As consequências do "Não" francês

Um não à Constituição, como parece querer, segundo sondagens recentes, a maioria dos franceses, faria correr à União um tremendo risco de desintegração. Não seria apenas uma paragem. Seria um imenso recuo, que só podem desejar aqueles que sempre sonharam com uma Europa que fosse um mero espaço de livre câmbio, um mercado único alargado e competitivo, mas nada mais do que isso. Seria o fim da Europa política, social e com uma entranhada cultura ecológica. Pior do que isso: seria o fim da União como «potência mundial» capaz de equilibrar as relações euro-americanas e de resistir às pretensões do hegemonismo imperial, que vê a ONU como um empecilho. Os "falcões" que aconselham Bush, seguramente, agradeciam!
Não me espanta que com o aproximar da data do referendo francês (e ainda faltam cerca de 6 semanas) e com os resultados das sondagens que semanalmente vão sendo reveladas o pânico entre os federalistas e euro-entusiastas seja cada vez maior. É igualmente natural que estes anunciem cenários catastróficos como resultado inevitável do "Não" francês. A realidade é contudo (nuns casos felizmente noutras infelizmente) bem diferente e convém não deixar que as paixões nos tolham o raciocínio.

Para Soares a rejeição parece implicar o fim da UE. Parece querer dizer que a rejeição de um novo tratado significará a rejeição os anteriores. Esta é uma versão alternativa da velha "teoria da bicicleta" segundo a qual o "projecto europeu" tem de estar sempre em evolução sob pena de uma queda aparatosa. Parecem, à partida, rejeitar qualquer tipo de estacionaridade.

Em segundo lugar, e neste caso infelizmente, a rejeição não implicará o fim dos sonhos de união política nem das políticas de harmonização comandadas a partir de Bruxelas. Será, quando muito, um compasso de espera nos projectos de união política. O mais provável é que a Constituição reapareça, passado o periodo de nojo, talvez numa versão mais soft.

É curioso que Soares não refira que a rejeição dos franceses se baseia na defesa do "Modelo Social Europeu" cuja continuidade diz depender do projecto constituicional e que a constestação seja liderada pelos seus "compangnons de route". Registe-se ainda que Soares faz depender da Constituição a criação de uma "cidadania europeia" (como se esta pudesse ser criada por decreto) que os euro-entusiastas dizem já ser uma realidade.

Por último Soares parece (ainda) acreditar na UE como sendo capaz de constituir uma potência alternativa aos EUA. A maior parte dos líderes europeus parecem ter já abandonado esta quimera e reafirmado a sua aliança com Washington. Soares continua no mundo da fantasia. Já agora e centrando-nos apenas na ONU e na questão política, é significativo que no Conselho de Segurança, onde seria mais fácil provar que existe uma política externa comum europeia se tenha verificado uma completa dissonância entre o RU e a França e nenhum dos dois pareça querer abdicar do seu lugar em favor da UE.