28.11.05

Democracia mediática II

Gostaria de saber, por exemplo, o que entende exactamente a Marktest por "protagonista". É-se "protagonista" só quando se aparece no écran, ou também quando o pivot fala de nós? É-se "protagonista" quando o foco dos holofotes está sobre um dos nossos apoiantes e ele fala de nós de forma mais ou menos clara? E quando é de forma mais ou menos velada? E quando Soares fala de Cavaco quem é o "protagonista"? O Soares ou o Cavaco? Ou ambos? Quem é o "protagonista" quando as televisões escolhem, entre tudo o que Louçã diz, a frase "Cavaco não diz nada"?

E também pergunto a mim próprio por que motivo foi escolhido o período de tempo que foi. É que desde 22 de Agosto até hoje houve as eleições autárquicas e uma campanha eleitoral (e uma longa pré-campanha) em que os líderes dos partidos se fartaram de aparecer, por inerência de cargo. E adivinhem quem são os líderes partidários que se candidataram a Belém? Nem mais: Louçã e Jerónimo, os dois mais "protagonistas" entre os "protagonistas". Dá-me a sensação de que aqui estamos a comparar coisas que não são comparáveis, o que é capaz de criar enviezamentos no método e, portanto, nos resultados.
No Margens de Erro Pedro Magalhães tenta esclarecer:###
O que significa "notícias protagonizadas por cada personalidade"? Suponho que uma notícia é contada como tal quando os candidatos são explicitamente objecto de notícia, mas não posso estar seguro. Não descobri no site da Marktest a definição operacional desta variável.

(...)

Olhemos, por exemplo, para o que se passou desde a semana 42 (uma semana depois das autárquicas) até à semana 45 (que terminou no dia 13 de Novembro):

Mário Soares: 79 notícias, 215 minutos;
Cavaco Silva: 54 notícias, 163 minutos;
Manuel Alegre: 55 notícias, 147 minutos;
Jerónimo de Sousa: 52 notícias, 139 minutos;
Francisco Louçã: 51 notícias, 139 minutos.

De facto, faz diferença a exclusão do período das autárquicas. Após este período, Mário Soares conseguiu aparecer nas televisões com uma frequência e duração superior à dos restantes candidatos. Cavaco Silva surge em segundo lugar, mas muito por força daquele dia em que as televisões acompanharam o lançamento da sua candidatura, o que levou a notícias com muito longa duração.

Isto mede aquilo que mede. Não mede conteúdo/enviesamento da notícia, não mede o seu posicionamento na hierarquia do alinhamento noticioso, nem deve contar com notícias indirectamente relacionadas com os candidatos. Vale o que vale, como se diz das sondagens...
Apesar da enorme exposição mediática de Mário Soares, este não consegue aproximar-se, nas sondagens, de Cavaco Silva ou destacar-se de Manuel Alegre. Confirmam-se, portanto, as palavras de José António Saraiva, director do semanário Expresso:
O curioso em Mário Soares é que parece indiferente aos sinais do eleitorado.

Não é verdade que, em Fevereiro, ficou claro que as eleições se ganham facilmente falando pouco do que falando muito?

Não é verdade que a crítica mais frequente a Sócrates era não falar, não responder aos jornalistas, não esclarecer o que pensava - e foi assim que obteve a maior maioria alguma vez alcançada por um líder socialista?

Não é verdade que Guterres falava bem, se desdobrava em declarações, irradiava simpatia - e nunca conseguiu chegar à maioria absoluta?

Soares incita Cavaco a falar, desafia-o, provoca-o - mas será que os portugueses gostam dos políticos que falam muito ou, pelo contrário, já não acreditam neles?
Os estrategas da campanha de Soares chegaram a semelhante conclusão. No PortugalDiário:
Mário Soares vai deixar de fazer ataques frequentes a Cavaco Silva, pelo menos no período de pré-campanha das eleições Presidenciais, disse hoje à Lusa um dos principais conselheiros do candidato a Presidente da República apoiado pelo PS.

Segundo o mesmo responsável da candidatura do ex-Presidente da República, «num primeiro momento», os ataques de Mário Soares ao ex-primeiro-ministro do PSD «justificaram-se por terem o objectivo de traçar um quadro de bipolarização na campanha».
Nota: caro Jorge Candeias, obrigado pelo aviso; a "bem da verdade", este não é um blog de "direita" nem existiu qualquer intenção de passar "ao lado" deste assunto.

PS: o arquivo insurgente é um problema que, até agora, não teve ainda resolução.