23.11.05

O século do Atlântico

Try a simple experiment. Lay out a map of the world. With a pencil and ruler, connect the United Kingdom, Spain, and Portugal with all the countries in the Americas or in Africa to which they have historical or cultural ties. Next, connect the countries of Africa to those states of the Western Hemisphere to which they have ethnic and cultural ties. Now connect the United States to the countries in Latin America and Africa to which we have ties of population and culture. You have just drawn the most promising strategic network of this century.

RALPH PETERS, Parameters, The Atlantic Century, Outono 2003, p. 16.


É muitas vezes referido ser o século XXI, o século do Pacífico. Depois do Atlântico ter substituído o Mediterrâneo, como centro estratégico e de trocas comerciais, uma nova troca estaria agora a operar-se. O poder mundial e a capacidade de investimento seriam transferidos para aquela região. Os interesses norte-americanos, o seu dinheiro, poder e capacidade militar, que tanto contribuíram para a paz de 60 anos na Europa, seguiriam o mesmo caminho. O Atlântico ficaria estrategicamente morto e os Estados por ele banhados marginalizados. Haveria menos oportunidades económicas, consequente descida do nível de vida, menor interesse nas alianças existentes e menor capacidade em lidar com as ameaças que assolam qualquer sociedade em decadência.

No entanto, todas as teorias que apontam para a substituição da Europa pelo Extremo Oriente, apenas o fazem em referência ao Atlântico Norte. Mas se olharmos mais a sul, o futuro está lá. No Atlântico Sul. Na América Latina e em África, que passam no presente por profundas transformações e, em muitos locais, apresentam magníficos resultados. A título de exemplo, temos Moçambique e Angola que apresentam das maiores taxas de crescimento económico a nível mundial.

Não cabe aos governos liderar processos de investimento, mas criar condições que permitam a concretização de bons investimentos. O Estado não deve apoiar com subsídios os negócios das empresas no estrangeiro, mas cabe-lhe garantir a segurança dos mercados. Ora, existe para isso melhor meio que o da integração de Estados como o Angola, Brasil, Cabo Verde e Guiné-Bissau no Pacto do Atlântico Norte, na NATO?
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O novo euro-atlantismo poderá passar pelo alargamento do seu conceito geográfico. Deverá ser uma união de nações de raiz liberal e ocidental. Dever-se-á alargar ao Atlântico Sul, cooperando com os Estados mencionados.

Para ameaças globais, alianças globais. Alianças feitas entre países independentes e soberanos, num futuro promissor para todos. Construídas com seriedade, baseadas na dignidade da pessoa humana e na aspiração dos povos, na igualdade entre os Estados e na abertura dos mercados. Se a NATO foi uma aliança de países ocidentais contra a União Soviética, poderá ser agora uma aliança de nações democráticas

Os EUA estão atentos ao Atlântico Sul, o que explica a citação do artigo do Coronel Ralph Peters, na revista militar Parameters. De acordo com Peters, Portugal (tal como a Espanha e o Reino Unido), também por estar na União Europeia, serão os grandes aliados da América neste desafio. Portugal corre o risco de perder importância estratégica, mas tem uma oportunidade de ouro que não pode desaproveitar. Basta mudar o disco. Alterar a política e afastar fantasmas. Apostar na Europa, como europeus que somos, mas não esquecer laços e oportunidades que existem no Atlântico.

O mundo está cada vez mais integrado. Zonas esquecidas e recônditas ganham interesse e força. A Europa é importante, mas desde 1989 que já não é o centro. A bem da paz, da democracia e no respeito mútuo dos povos, está na hora do regresso. A Espanha já está na América Latina. O que falta para irmos a jogo?

Qualquer estrangeiro que olhe para o mapa-múndi e conheça os contactos portugueses em África e no Brasil, pasma-se com a tacanhez da nossa da política externa. Vejamos uma coisa: Estamos na Europa, banhados pelo Atlântico e com um óptimo capital humano no relacionamento com o Brasil (um das potências emergentes) e com África. Qual a vergonha em tirar partido disto?

O mundo globalizou-se e espera por nós. Na verdade, está à espera de todos.

P.S.: O conhecimento deste artigo de Ralph Peters deveu-se a indicação do Professor Miguel Monjardino.