6.12.05

Reinaldo Azevedo e a Venezuela

"Boicotar uma eleição ou pregar o voto branco ou nulo é um ato tão democrático como votar. Em certas circunstâncias, pode ser até mais. A mídia está sob censura prévia branca na Venezuela. Chávez domina os três Poderes daquela, a esta altura, quase-República. Um jornalista pode ir para a cadeia, e o jornal pode receber uma multa severa apenas porque o coronel não gostou de um texto, caso em que aciona a Justiça, mero instrumento do bolivarianismo, para perseguir a ambos. A oposição só pode promover atos de protesto com autorização. Participar do pleito, nessas condições, corresponde a fazer o jogo de Chávez, legitimando uma ditadura que está sendo meticulosamente construída com os instrumentos da democracia.
(...)
Uma oposição, na prática, proibida de se manifestar, num país em que a imprensa está sob censura, faz o quê? Coonesta as eleições? Têm mais é que as boicotar, evidenciando o que está em curso. E não me venham com paralelos com a ditadura brasileira e a resistência pacífica do MDB. São situações completamente distintas. Uma coisa é ir paulatinamente provocando fissuras num regime escancaradamente discricionário. Outra, diferente, é fazer parte de um jogo que vai mudando por dentro a codificação do regime democrático. Fosse eu venezuelano, estivesse lá, proporia e faria justamente o que faz e propõe a oposição no país. Que os 'observadores internacionais' endossem o ritual de absolutismo político bolivariano. Não vejo nada de golpista no protesto. Golpista é Chávez — um tipo bem esperto de golpe, é verdade. Há quem goste. Eu não gosto."

Reinaldo Azevedo, "Fast-food politicamente correto"