30.5.06

Deixem-nos em Paz! (longo)

Dado que o “crescimento económico” é o grande problema actual e a nossa Administração promete “estimulá-lo” – para conseguir a prosperidade geral através de cada vez maiores controlos governamentais, ao mesmo tempo que gasta riqueza que não produz – pergunto-me quantas pessoas sabem a origem do termo laissez-faire?
A França do século dezassete era uma monarquia absolutista. O sistema francês da época tem sido descrito como “absolutismo limitado pelo caos.” O Rei detinha o poder total sobre a vida, o trabalho e a propriedade de todos – e só a corrupção dos agentes governamentais dava ao povo uma margem não oficial de liberdade.
Luís XIV era o arquétipo do déspota: um medíocre pretensioso com ambições de grandiosidade. O seu reino é tido como um período brilhante da História francesa: proveu o país com um “desígnio nacional,” sob a forma de longas e bem sucedidas guerras; estabeleceu a França como potência líder e centro cultural da Europa. Mas os “desígnios nacionais” custam dinheiro. As políticas fiscais do seu governo conduziram a um estado de crise crónico, resolvido pelo imemorial expediente de drenar o país através dos sempre crescentes impostos.
Colbert, o conselheiro chefe de Luís XIV, era um dos primeiros estatistas modernos. Acreditava que regulações governamentais podem criar a prosperidade nacional e que maiores receitas fiscais podem ser obtidas pelo simples “crescimento económico” do país; assim, dedicou-se a procurar “o aumento geral da riqueza pelo encorajamento da indústria.” O encorajamento consistia em impor incontáveis regulações que sufocavam a actividade empresarial; o resultado foi um insucesso sombrio.
Colbert não era um inimigo dos negócios; não mais que a nossa actual Administração. Colbert era ávido de ajudar a engordar as vítimas sacrificiais – e numa ocasião histórica, perguntou a um grupo de industriais o que poderia fazer pela indústria. Um dos empresários de nome Legendre respondeu: “Laissez-nous faire!”
Aparentemente, os empresários franceses do século dezassete tinham mais coragem que os seus homólogos americanos do século vinte, e uma melhor compreensão da economia. Sabiam que a “ajuda” dos governos aos negócios é tão desastrosa como a perseguição governamental, e que a única maneira de o governo estar ao serviço da prosperidade nacional é não intervindo.
Dizer que aquilo que era verdade no século dezassete não tem possibilidade de ser verdadeiro hoje, porque viajamos em aviões a jacto, enquanto eles se deslocavam em carruagens puxadas por cavalos – é como dizer que não precisamos de comida, como os homens precisaram no passado, porque nós usamos gabardinas e roupa folgada, em vez de perucas polvilhadas e saias armadas. É este tipo de superficialidade limitada por barreiras concretas – ou inabilidade em agarrar princípios, para distinguir o essencial do não essencial – que cega as pessoas perante o facto que a crise económica dos nossos dias é a mais velha e antiga da história.
Considere-se o essencial. Se os controlos governamentais não conseguiram nada além da paralisia, fome e o colapso numa sociedade pré industrial, o que é que acontece quando alguém impõe controlos sobre uma economia altamente industrializada? O que é mais fácil de regular pelos burocratas: a operação de teares e forjas manuais – ou a operação de siderurgias, fábricas de aviões e assuntos da electrónica? Quem mais provavelmente, trabalhará sob coerção: uma horda de homens brutalizados a desenvolver trabalho não qualificado – ou o incalculável número de homens individuais de génio criativo que são necessários para construir e manter uma sociedade industrial? E se os controlos governamentais falham mesmo com os primeiros, que profundidade de evasão permite aos estatistas modernos esperar que sejam bem sucedidos com os segundos?
O método epistemológico dos estatistas consiste em debates intermináveis sobre questões únicas, concretas, fora do contexto, imediatistas, sem nunca lhes permitir integrá-las numa soma, nunca se referindo a princípios básicos ou às últimas consequências – induzindo assim nos seus seguidores um estado de desintegração intelectual. O propósito do nevoeiro verbal é esconder a evasão de dois fundamentais: (a) a produção e a prosperidade são resultado da inteligência dos homens, e (b) o poder governamental é o poder da coerção pela força física. Uma vez que estes dois factos são reconhecidos, a conclusão a tirar é inevitável: que a inteligência não trabalha sob coerção, que a mente do homem não funcionará na ponta de uma arma.
Esta é a questão essencial a considerar; todas as outras considerações são pormenores triviais em comparação.
Os pormenores da economia de um país são tão variados como as muitas culturas e sociedades que já existiram. Mas toda a história da humanidade é a demonstração prática do mesmo princípio básico, independentemente da forma: o grau de prosperidade humana, realização e progresso é uma função directa e o corolário do grau de liberdade política. Como testemunha: antiga Grécia, a Renascença, o século dezanove.
Na nossa Era, a diferença entre a Alemanha Ocidental e a Alemanha de Leste é uma demonstração tão eloquente da eficácia de uma (comparativamente) economia livre versus uma economia controlada, que nenhuma discussão adicional é necessária. E nenhum teórico pode merecer consideração séria se evade a existência desse contraste, deixando as suas implicações sem resposta, as suas causas sem identificação, e a lição não aprendida.
Considere-se o destino da Inglaterra, “a experiência pacífica no socialismo,” o exemplo de um país que cometeu o suicídio pelo voto: não havia violência, nenhum derramamento de sangue, nenhum terror, apenas o estrangulador processo de “democraticamente” impor controlos governamentais – mas observem-se os actuais gritos acerca da “fuga de cérebros”, pelo facto de os melhores e mais hábeis homens, particularmente cientistas e engenheiros, estarem a desertar de Inglaterra correndo para qualquer pequeno resto de liberdade que consigam encontrar em qualquer lugar no Mundo de hoje.
Lembrem que o Muro de Berlim foi erigido para evitar uma “fuga de cérebros” similar da Alemanha de Leste; lembrem que depois de quarenta e cinco anos de uma economia totalmente controlada, a Rússia Soviética que possui algumas das melhores terras agrícolas no Mundo, não é capaz de alimentar a sua população e tem que importar trigo da América semi-capitalista; leia-se East Minus West = Zero de Werner Keller*, para uma imagem gráfica (não refutada) da impotência da economia soviética – e depois, julgue-se a questão da liberdade versus controlos.
Qualquer que seja o propósito para o qual alguém queira usá-la, a riqueza tem primeiro que ser produzida. No que respeita à economia, não há diferença entre os motivos de Colbert e os do Presidente Johnson. Ambos queriam alcançar a prosperidade nacional. Quer a riqueza extorquida pelos impostos seja drenada para o benefício imerecido de Luís XIV, ou para o benefício imerecido dos “hipo privilegiados” não há diferença para a produtividade económica de uma nação. Ser-se acorrentado por uma finalidade “nobre” ou ignóbil, para o benefício de pobres ou ricos, pela satisfação da “necessidade” de alguém ou da “cobiça” de outro – quando se é acorrentado, não se pode produzir.
Não há diferença no destino último de todas as economias acorrentadas, seja qual for a alegada justificação para as correntes.
Considerem-se algumas destas justificações:
A criação da “procura pelo consumidor”? Seria interessante analisar quantas donas de casa, com cheques da Segurança Social igualariam a “procura pelo consumidor” provida pela Madame de Maintenon e os seus numerosos colegas.
Uma distribuição “justa” da riqueza? Os privilegiados favoritos de Luís XIV não usufruíam uma vantagem tão injusta como os nossos “aristocratas do interesse,” as actuais e potenciais variantes de Billie Sol Estes ou Bobby Baker.
As exigências do “interesse nacional”? Se existe algo como o “interesse nacional,” realizado pelo sacrifício dos direitos e interesses dos indivíduos, então Luís XIV conseguiu-o superlativamente. A maior parte das suas extravagâncias não era “egoísta”: ele conseguiu levar a França a tornar-se uma das grandes potências internacionais – e destruiu a economia. (O que significa: conseguiu “prestígio” entre outros déspotas totalitários – à custa do bem estar, do futuro e da vida dos seus súbditos.)
O avanço do nosso progresso “cultural” e “espiritual”?É duvidoso que um projecto de teatro subsidiado pelo governo alguma vez produza uma disponibilidade de génio comparável com o suportado por Luís XIV no seu papel de “patrono das artes” (Corneille, Racine, Moliére, etc.). Mas ninguém, alguma vez equacionará o génio não nascido daqueles que perecerão sob tal sistema, que não quererão aprender a arte do lambe-botismo reclamado por qualquer patrono das artes político. (Ler Cyrano de Bergerac.)
O facto é que motivações não alteram factos. A exigência fundamental para a produtividade e prosperidade de uma nação é a liberdade: os homens não podem – e, moralmente, não o farão – produzir sob coacção e controlos.
Não há nada de novo ou misterioso sobre os actuais problemas económicos. Como Colbert, o Presidente Johnson apela aos vários grupos económicos, procurando conselho sobre o que pode fazer por eles. E se não deseja ficar na História com um currículo semelhante ao de Colbert, faria melhor em escutar a voz de um Legendre moderno, se tal coisa existe, que poderia dar-lhe o mesmo conselho imortal numa palavra: “Desregule!”


*New York: G. P. Putnam’s sons, 1962.