29.8.06

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O líder do Hezbollah confessou que jamais teria ordenado a operação em que três militares israelitas foram mortos e dois raptados se "soubesse que isso iria trazer uma guerra de tais dimensões". Hassan Nasrallah imaginava, presume-se, que Telavive se limitaria a pôr um anúncio no jornal, prometendo alvíssaras a quem mandasse informações sobre o paradeiro dos seus soldados.###

A máscara de inocência exibida pelo Hezbollah não espanta. Ao fim de algumas semanas de guerra, durante as quais a tese da desproporção da resposta israelita, propagada pelas mais diversas instâncias, circulou por todo o mundo e foi legenda para todas as imagens que as televisões mostraram, Hassan Nasrallah achou que era altura de extrair a conclusão e pôr a cereja no bolo. Afinal, o seu partido tem a noção das proporções, razão por que nunca lhe passou pela cabeça que os sionistas retaliassem nos modos com que o fizeram. Não lhe cabe, portanto, a mais leve culpa pelo que sucedeu.

A confissão do líder do Hezbollah seria unicamente cinismo, se não fizesse parte da propaganda destinada a incutir na opinião ocidental a ideia, já bastante espalhada, de que o partido é um "movimento de resistência", que apenas quer libertar o Líbano. Numa altura em que se tenta constituir uma força internacional para intervir no Sul deste país, o Hezbollah retira o capuz terrorista que usa habitualmente e mostra-se como se fosse o mais sincero aliado dos que buscam a paz no Médio Oriente. O ser um partido armado no interior de um Estado sem capacidade de se lhe impor militarmente é, decerto, um pormenor. O ser agente de duas potências regionais que lhe garantem o armamento, outro pormenor. O ignorar todas as resoluções das Nações Unidas a recomendar o seu desarmamento, uma insignificância. Só alguém de má-fé poderia, em tal contexto, considerar uma coisa tão banal, como é, para o Partido de Deus, o rapto de soldados estrangeiros, uma acção que justifique uma guerra...

Dá-se, até, uma situação curiosa: ao mesmo tempo que os apoiantes do Hezbollah na Europa se revoltam à simples ideia de enviar para o Líbano uma força de intervenção, mesmo se a coberto de uma resolução da ONU, o Hezbollah garante acolher a hipótese de braços abertos, desde que, obviamente, não lhe tirem as armas. Decididamente, a propaganda faz milagres.